O adeus do capitán (por burofax)
Sei lá, acho que sempre volta a acontecer.
Falo do movimento cíclico das glórias: um dia é de caça….
Vide um dos grandes tópicos da mídia espanhola dos últimos dias —o que ninguém diz, o que ninguém profere, mas que seria, que poderia ser, em letrinhas garrafais subliminares tipo soco-na-barbicha-triste-do-bode:
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** A-DECADÊNCIA-DO-BARÇA **
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Tal agouro foi coroado ontem (25) pela cartada final de Messi, maior artilheiro da história do Barça, aka Fútbol Club Barcelona, que enviou um #burofax comunicando seu desejo de sair do clube.
Instantaneamente, o burofax, que ninguém até ontem ninguém sabia o que era, virou trendy topic internacional.
A notícia da possível saída de Messi vem apenas duas semanas depois da derrota histórica do clube na semifinal da Liga dos Campeões, quando o Barça tomou uma lambada de 8×2 dos bávaros do Bayern.
Logo depois da partida, sucederam-se aspas bombásticas. E vocês sabem: aspas bombásticas sempre rendem manchetes e tacam o turbo no alastramento da histeria coletiwwva.
Piqué declarou que sentia “vergonha”: “Tocamos fundo. É preciso renovar-se e, se eu tenho que sair para isso, sairei” (hmm).
Quique Setién, técnico do Barça há apenas oito meses e sabe-se lá por quantos menos, exercitou essa divina capacidade randômica que têm os futeboleiros de dizer Coisa Nenhuma: “o time se entregou, fizemos o que pudemos e o que o rival ´deixou´. À medida que avançou o jogo, nos vimos superados”.
E os comentaristas, esses sádicos serelepes: “Baaaño descomunal” (numa tradução livre, ´goleada´, ´sofrimento´, ´humilhação´, ´desgracêra´, ‘o horror, o horror’). “Demolidor: o Barcelona levou cinco gols no encontro da Copa Europa pela primeira vez em sua história” (nota: isso foi dito lá pelo minuto 71 da partida, porque o que tá ruim sempre pode piorar).
Menos de 24 horas depois do burofax de Messi, já estamos vendo reações populares sob o clamor #MessiQuedate (Tipo ¨Fica Messi¨), #MessiSeVa e #MessiSiBartoNo, pedindo a saída do presidente do Barça, Josep María Bartomeu.
A próxima grande manifestação popular está marcada para este domingo 30 em Barcelona. ¨Sobretudo, respeitemos as medidas de segurança indicadas pelo governo¨, avisa o grupo @TsunamiCuler, responsável pela convocatória.
Infelizmente, não é o que se vê nas manifestações impromptu que estão começando a acontecer na cidade:
FIM DE RELACIONAMENTO
¨Não contemplamos nenhuma saída contratual. Queremos que [ele] fique¨, declarou hoje o secretário técnico do clube, Ramon Planes, no que vem sendo interpretado como um discreto prenúncio de pé-de-guerra. “Pensamos no futuro do Barça com Messi. Nossa ideia é construir um time em torno do melhor jogador do mundo”, completou.
Aixx, que sensação ruim de fim de relacionamento, quando uma das partes envolvidas ainda tá se agarrando à última folhinha da goiabeira do precipício.
Eu não entendo de futebol, e nem é minha intenção aqui. Confesso, pra desagrado de muitos, que até tenho saudade de quando o Neymar jogava no Barça.
Naquela longínqua era, eu podia me juntar aos torcedores catalães —uma classe fanática de caráter, digamos, mais denso e meditativo que o Jeitinho Brasileiro de Torcer, e conhecidos como “culés” —gritando “Neymaaaar, eôô” nos bares.
E de brinde ainda provocava a ira dos compatriotas: “mas o Neymar, gente! se o Neymar é um inútil! Olha o cabelo dele! O jogo dele! A grana que ele ganha! E voltou com a Marquezine DE NOVO!!”. Ah, o amor, o circo e minha vã e lilliputiana perversidade sem profundidade.
Então, voltando, não entendo muito de bola, mas de repente a litania pré-luto do Adeus-Messi e o mistério do burofax estão por toda parte. Messi & The Burofax são pop. Tão impossível de ignorar quanto música da Anitta cantando “A Paradinha a-a-a”.
OK, MAS O QUE CAZZO É BUROFAX?
Eu, tão afeiçoada a minúcias dos universos paralelos, fui ler sobre o tal burofax. Ora, nada mais é do que um recurso oferecido pelos Correios espanhóis para envio de comunicados com potencial validez diante de um tribunal.
Algo parecido existe em todo o planeta, mas só aqui tem esse nome que lembra um fiote de fax com burocracia com mimeógrafo e código morse do capeta antológico.
Ou seja/ilustrando: Messi poderia ter enviado um e-mail ou um whatsapp dizendo “adeu” em catalão, mas nesse caso o Barça poderia argumentar que ele simplesmente pediu mais Coca-Cola Zero com zero cafeína durante os treinos.
Com o burofax, no entanto —que, ao contrário do que pensam quilos de internautas e alguns órgãos de imprensa internacionais, não é um fax, mas uma carta —, o comunicado adquire peso oficial e instantânea qualidade de cabeça-de-fórfi de frenesi mediático. Onze euros pra enviar, capacidade de abalar: não tem preço.
Segundo uma cláusula de seu contrato, Messi poderia optar por deixar unilateralmente o clube a cada final de temporada. Atualmente, dizem que sairia pagando a bagatela de 700 milhões de euros (ou 4,6 bilhões de reais, ai, meus saaaais, minha conta bancária vaziiiiaaaa).
Não está claro ainda para onde iria o jogador argentino, cujo nome completo, convenhamos, é fabuloso: Lionel Andrés Messi Cuccittini. Poderia ser o PSG, do compay Neymar, o Manchester, o Inter de Milão ou, quem sabe, o Pirassununguense. Talvez a gente até esqueça adiante desse campeão, atualmente considerado o melhor jogador da história do Barça e o que detém mais recordes no Guinness. Mas uma coisa é certa: o burofax a gente não vai esquecer mais.