A máscara da discórdia, abóboras e crises

Barcelona, city of leisure and catedrais inacabadas.

Aconteceu no metrô cheio ao meio-dia.
Segue a tradução (algo) livre:

— SEU VELHO TONTO! (sic)
— TONTO É VOCÊ!
— ORA, MAS QUE POUCA VERGONHA! QUERIA VER UM POLICIAL AQUI AGORA TE PASSANDO UMA CORREÇÃO!
— APROXIMA TUA CARA DA MINHA BOTA PRA VOCÊ VER O QUE PENSO DISSO! (nessa parte, eu confesso, vibrei)
— ESPERO QUE MORRA LOGO! SEU VELHO!
— FALÔ, JOVEM!!!

Esse simpático diálogo, que só tem sua graça aqui escrito, ocorreu entre um casal de idosos sentados diante de um outro idoso que, algo bêbado (eu sei porque estava sentada do seu ladiño), levava a máscara cirúrgica azul em sua famosa Modalidade Inútil Número 1: com o nariz de fora.

— Senhor, perdão, mas a máscara é obrigatória pra todos nós. Por favor, ponha direito –intervim* a certa altura, tentando apaziguar os ânimos.

* vaya palabra rara de cojones ⤜(ʘ_ʘ)⤏

Impaciente, o caballero da napa de fora acatou meu pedido. Só pra, adiante, no meio da “pelea” (briga), tirar completamente a máscara, encarando desafiante seus oponentes, que, é verdade, também estavam começando a me irritar com o incessante murmúrio bullyiesco contra o ciudadano.

Choquei, gente. E me choquei com meu choque de ver um ser humanus arrancando a proteção anti-Covid no metrô.

Todos os demais espectadores naquele vagão do meio-dia: caladinhos detrás de suas máscaras. Ora, pipokas.

***

A Espanha vive atualmente a terceira onda da pandemia, com 38 mil casos novos nas últimas 24 horas.

A média acumulada nacional é de 886 casos por 100 mil habitantes, com algumas regiões, como Valência, ultrapassando os 1.400 casos por 100 mil. Somos o quinto país comunitário mais afetado pelo vírus agora mesmo, atrás de Portugal (1.484 por 100 mil habitantes), República Checa (1.010), Irlanda (926) e Suécia (564).

Na última segunda-feira (25), a Comissão Europeia recomendou que todas as zonas com mais de 500 casos por 100 mil habitantes sejam isoladas. Mais de 85% do território espanhol corresponde a esse critério –e em sua quase totalidade já leva meses em confinamento perimetral, ou seja, nada de entrar ou sair se não for estritamente essencial.

Por enquanto, há zero casos notificados da nova variante brasileira em território espanhol, contra um da cepa sul-africana e 350 da cepa britânica. Espera-se a chegada massiva desta última a partir de meados de fevereiro ou princípios de março –o que significa que as medidas restritivas poderão previsivelmente prorrogar-se por pelo menos mais uns dois meses (falô, jovem!!).

O ritmo de vacinação, que começou bem, arrefeceu significativamente na última semana, com a redução do fornecimento comunitário dos lotes da AstraZeneca/Oxford.

O consórcio alega um problema nas fábricas europeias; por outro lado, a Comissão Europeia insiste na ideia de impedir a exportação de vacinas produzidas pelo grupo na Europa para fora do continente enquanto o fornecimento interno não se normalizar.

Pra completar a cereza nos buñuelos de viento, há uma semana temos uma nova ministra da Saúde: a canária Carolina Darias, que deixou a pasta de Política Territorial e Função Pública para assumir la bucha do que vem por aí.

Salvador Illa, o titular anterior, deixa o cargo em plena “tercera ola” para concorrer às eleições locais na Catalunha em fevereiro, com uma plataforma enfocada na ideia de reconstrução e a bênça do premiê Pedro Sánchez (yes, e a oposição, que não se bica, já se juntou e criou uma cantilena: “todos contra Illa”).

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Outro dia, limpando a fruteira, dei de cara com uma abóbora em pleno e glorioso processo de putrefação (shame on me, foi uma exceção na minha vidinha de frutinha lover –não sei se ces já sabiam, mas abóbora, pasme e dance, é fruto).

Maravilhada, tirei muitas, muitas fotos, algumas das quais ora reproduzo. Sou fascinada por fungos e putrefações orgânicas (claro, Susana, ou cê curte também putrefações plásticas? hmmmmm). Essa tara volátil vem de infância, quando cultivei os primeiros bichinhos em pote de vidro com papaya no lavabo de casa.

Estrela glaciar-estetoscônica kubrickovska jiraiana teta plus 81A58-2021 (Susana Bragatto / Folhapress)

 

Essa é nossa coruja espanta-pombas, que costuma fazer amizade cas perseguida (Susana Bragatto / Folhapress)

Essa beleza toda (“parece foto de satélite”, comentou alguém), tão transitória, profundamente vida. Jovens, jovens, uni-vos-nos, antes que viremos abóbora…

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